domingo, 29 de maio de 2011

Ainda os Enfermeiros

Alguns já me disseram que as posições sobre a Enfermagem neste blog são incompletas e ambíguas.
Não pode ser de outra forma. O espaço seria insuficiente para uma dissertação mais séria, e o objectivo é apenas demonstrar uma visão diferente, limitada e geralmente temática, sobre uma determinada classe que me é próxima e complementar no dia-a-dia.
Em primeiro lugar, cada qual seguiu a profissão que bem entendia. Que eu saiba, isto já não funciona por castas nos dias de hoje, tivemos os mesmos concursos, e fomos distribuídos de acordo com critérios iguais para todos pelas vagas do Ensino Superior que estavam disponíveis, pela ordem que as regras ditavam, de acordo com as vocações de cada qual e respectivos resultados.
Quem foi para Medicina já sabia que não ia ter salário aos 21 anos como (à data) acontecia com os enfermeiros, não ia trabalhar por turnos, etc....
Por outro lado, sabia-se que, a prazo e depois de muito mais tempo de estudo, se teria melhor salário, bancos de 24 horas (conforme as Especialidades), e nessa fase dos 18 anos pouco mais....
Posto isto, não vou rematar com um "cada qual, a partir daí, deve viver com as competências das respectivas profissões".
Essas competências, já o escrevi, devem ser, e são, dinâmicas.
Concretamente, a questão da "prescrição", e dos "diagnósticos de Enfermagem". Grande parte da celeuma que isso causa na minha "Classe" se deve ao facto de julgarmos que o Enfermeiro se vai sentar em frente ao doente e, do alto dos seus 4 anos de curso, desatar a adivinhar qual a doença do doente, e como a deverá tratar, tal como um médico o faz após 6 anos de curso, 2 de Internato Geral e 4 a 6 de Especialização. Ou seja, que os Enfermeiros pretendem a mesma competência com metade a um terço da nossa formação.
Não é obviamente disso que se trata, e em vez de alguma facção radical-caviar da Enfermagem se dedicar a ressabiamentos foleiros acerca de um mal gerido complexo de inferioridade quanto aos médicos (o que é obrigatório acontecer quando ignoram competências alheias para as quais não estão nem de perto capazes de assegurar com qualidade semelhante), traduzidos muitas vezes em chavões próprios de mentecaptos, como a comparação de competências diferentes, logo incomparáveis, aproveitando-se sobretudo de alguma insatisfação na classe por problemas laborais decorrentes quase exclusivamente do excesso de profissionais (para as vagas existentes).
Em vez disso, dizia eu, deviam-se dedicar em explicar o que isso deve significar concretamente, para a devida definição das coisas e a melhoria subsequente dos cuidados aos doentes, que é no fundo o fim comum a que todos os profissionais sérios se deveriam dedicar, sejam médicos ou enfermeiros.
E é importante essa clarificação. "Diagnósticos de Enfermagem" e "Prescrições em Enfermagem" deveria ser, para simplificar, tudo aquilo que qualquer enfermeiro está cansado de saber, mas que tem que pedir ao médico para formalizar, quer o diagnóstico, quer a atitude a tomar em conformidade com o 1º.
O doente tem febre: o Enfermeiro deve dar o anti-pirético, após questionar o doente sobre possíveis alergias, não é necessário um médico para isso, e é ridículo que ainda assim seja nos dias que correm. Idem-aspas para inúmeros outros exemplos que poderia dar, como as obstipações, a gestão de sondas entéricas, vesicais, a gestão de analgésicos em cuidados paliativos, de perfusões de insulina em cuidados intensivos, com variações de acordo com o local em que cada qual está a trabalhar (uma Unidade de Paliativos difere duma de AVC's, que por sua vez é bem diferente de uma de Cuidados Intensivos Cardiológica ou Polivalente, por exemplo). Transportando para Consultas, as questões dos pensos, do tratamento das úlceras, do pé diabético, etc, etc....
No fundo, porque isto já vai longo, o que já acontece, informalmente, em todos os sítios que prezam por uma certa racionalidade na actuação prática, sem pedantices bacocas e delírios de autoridade sobre o conhecimento, que alguns colegas meus tristemente exibem, por outro lado e em contraponto aos radicais que referi antes....
Formalizar, portanto, o que já acontece informalmente nos sítios que trabalham bem.
Felizmente trabalho num sítio onde os médicos são muito bons, quer em qualidades médicas, quer nas pessoais, e os Enfermeiros são ainda melhores, e também nas duas vertentes. Ou seja: é muito fácil tudo isso que referi acima, dependemos todos uns dos outros, ajudamo-nos todos uns aos outros, fazemos tudo aquilo que sabemos e perguntamos o que não sabemos, acrescendo ainda por cima a isso tudo um desnecessário, ainda que sempre bem vindo, sentimento de profunda amizade e respeito uns pelos outros.
Gostamos de trabalhar juntos, mas também de estar juntos quando não trabalhamos. Bem como os "Auxiliares de Acção Médica", que se juntam assim a nós em todos os contextos e nos mesmos moldes.
Isso sim, é saber viver, e melhor ainda, saber trabalhar, bem e com gosto.
E pode acontecer em qualquer sítio, bastando para tal que não haja atritos entre "Classes" sem classe, mas tão só pessoas cheias de classe, ainda que de classes bem diversificadas....

7 comentários:

Unknown disse...

PArte 1: Antes de mais não posso deixar de o felicitar pela forma como aborda os variados temas retratados neste blogue, pelas opiniões, pela fluência das palavras que até há bem pouco tempo desconhecia.

Felicitá-lo, em segundo lugar, pela visão que adopta perante os colegas de trabalho, sejam eles médicos, enfermeiros ou auxiliares. Dizer-lhe que o ambiente saudável em que trabalha e certamente faz por manter é, de facto, invejável a muitos outros serviços e até instituições.

Em terceiro lugar não posso deixar de considerar, como refere no início deste post, a visão redutora que tem da profissão de enfermagem. Ainda que melhor que muitos outros (aqueles que entram nas guerras do conhecimento), verdade é que mantém um desconhecimento da profissão da Enfermagem, como ela é HOJE, como ela está a crescer e a desenvolver-se. Culpa sua, duvido ser, provavelmente do que é transmitido pelos colegas. Sou Enfermeiro e venho discordar de algumas ideias expressas neste post e no anterior sobre a mesma temática.

ESCREVEU: "Diagnósticos de Enfermagem" e "Prescrições em Enfermagem" deveria ser, para simplificar, tudo aquilo que qualquer enfermeiro está cansado de saber, mas que tem que pedir ao médico para formalizar, quer o diagnóstico, quer a atitude a tomar em conformidade com o 1º."

Nada mais errado. Diagnósticos de enfermagem existem, não porque se baseiam naquilo que queremos fazer e temos de pedir ao médico para formalizar, MAS ANTES, tudo aquilo que decorre dos CONHECIMENTOS DA DISCIPLINA E CIÊNCIA DE ENFERMAGEM (algum do conhecimento sobreponível com o médico), que é, como se sabe, uma ciência AUTÓNOMA. Ora os diagnósticos não são mais que um problema identificado (alteração do padrão de eliminação) associado a uma manifestãção desse problema (reduzida ingesta hidríca, reduzida adesão à terapêutica,...). Segundo a linguagem CIPE, adoptada cada vez mais pelos enfermeiros, estes SÓ DIAGNOSTICAM AQUILO QUE PODEM RESOLVER AUTONOMAMENTE, logo nunca irão diagnosticar uma infecção urinária nem um cancro de qualquer espécie. Ora associadas a estes diagnósticos, estão também associadas prescrições de enfermagem, dirigidas ao doente e os outros colegas, sempre na esfera de autonomia do enfermeiro.

Os médicos tratam a doença, os enfermeiros tratam a pessoa com doença. E só aqui, vai uma ENORME diferença.



(continua)

Unknown disse...

PArte 2:
Neste contexto, o médico não formaliza NADA. Saiba apenas que formaliza a prescrição de medicamentos, exames complementares de diagnóstico e de um ou outro dispositivo acessório. Fora isso, aquilo que os enfermeiros fazem é da competência destes, na esfera do seu conhecimento próprio. Dos exemplos que dá, da febre, da obstipação, a analgesia, tudo isso, naturalmente considera, por defeito de formação, que se resolve com medicação. Saiba que, previa e complementarmente a medidas farmacológicas, existem centenas de intervenções de enfermagem que são usadas e, na maioria das vezes, nem sequer ouve falar delas. A medicação é um complemento de muito trabalho de enfermagem realizado e vice-versa.

Que me diga que muito deste conhecimento partiu da esfera estritamente médica, é verdade. que me diga que muitas destas coisas são demasiado simples, é verdade. que me diga que são feitas por outros profissionais de saúde, não devia ser verdade. Agora é também verdade que nenhum outro profissional combina conhecimentos de áreas tão abrangentes e mais que todos os outros na saúde nos últimos 30 anos, desenvolveu tanto as suas competências. Os enfermeiros crescem a um ritmo alucinante, a sua formação é cada vez mais completa, as competências são cada vez mais complexas e evoluem, como as médicas, de fisioterapia, dos nutricionistas e afins. Naturalmente algumas esbarram nas outras, os governos querem poupar e colocam auxiliares a fazer trabalho de enfermeiros e enfermeiros trabalho de médicos, sai mais barato dizem.

Mas é igualmente verdade, constata a OMS, as associações de saúde americas e inglesas (NHS), que os Enfermeiros, que prescrevem medicação (que não necessita de prescrição), garantem os mesmos ou melhores níveis de segurança, eficácia e satisfação que os médicos. A sério? Diz que está numa série de relatórios dos últimos 3 anos destes organismos.
E faz a diferença? Faz. Faz para todos aqueles com acessibilidade reduzida e que necessitam de atendimento básico e não o têm. Faz para aqueles que necessitam de um atendimento célere e por causa da espera e da má gestão hospitalar desenvolvem competências que poderiam ser evitadas com um atendimento atempado. Saiba que enfermeiros prescrevem nos EUA, Inglaterra, Canadá, Espanha e a tendência é para aumentar, pois os resultados são por demais positivos, especialmente para os DOENTES. Adiante, pois essa conversa é a de outros países e não do nosso e, honestamente, temos muitas competências para ver reconhecidas antes dessas.

O que nos leva aos enfermeiros "tradicionais" e os enfermeiros "hi-tech". Como constato, a sua grande pena leva-o a desejar que os enfermeiros se mantenham: "quem está junto do doente, é seu amigo e confidente, seu "tratador" naquilo que temos de mais íntimo e que é a nossa higiene pessoal, é seu monitor de parâmetros vitais e o primeiro passo no reconhecimento de sintomas e sinais, o interlocutor com outros actores (como médicos) e por isso na abordagem adequada subsequente e instituição do tratamento apropriado."

Unknown disse...

Parte 3:

Somos isso tudo, mas muito mais. Os registos ridiculamente extensos que produzimos (extensos porque ainda não informatizados) são fundamentais pois baseiam a continuidade de cuidados e transmissão de informação (que tanto prezamos por se tratar de algo indispensável ao tratamento correcto dos doentes) e baseiam a protecção legal face a erros, acidentes e outros que tais (e não o encobrimento dos amiguinhos e vamos ficar todos calados para ver se isto não dá em nada). Aquilo que registamos traduz-se em responsabilização pelo que fazemos, bem ou mal, e representa a seriedade com que tratamos cada doente. Traduz também a necessidade de demonstrar que somos verdadeira e visivelmente responsáveis por um conjunto enorme de ganhos em saúde para os doentes, hospitais e economia nacionais.

Como sabe a quase totalidade do financiamento dos hospitais é baseado em actos médicos, com alguma contabilização lateral do que fazem os outros profissionais. Não existe reconhecimento tácito do que estes fazem, daí ser necessário demonstrar por A+B que a cirurgia do Sr. António não foi a única coisa que lhe trouxe ganhos em saúde: as competências dos enfermeiros de hoje em dia foram capazes de prevenir complicações graves no período de recobro e internamento, os diagnósticos e prescrições de enfermagem permitiram optimizar e melhorar exponencialmente a recuperação do mesmo, permitiram-lhe gerir autonomamente o regime terapeutico, saber quais os cuidados a ter quando regressar a casa, entre tantas tantas outras coias, que nenhum médico, medicamento ou profissional de saúde faz.

Se quiser saber verdadeiramente o que é a Enfermagem e o que fazem os enfermeiros tem de tirar um curso de Enfermagem. Não meu amigo, não pode nem sabe fazer o que um enfermeiro faz, por mais simples que lhe pareça. Seria um risco para si e para aqueles que cuida.

Sabe que somos complementares. Sabe que somos importantes nalgumas funções no decurso da doença.

Saiba, já que pode não ter essa noção, que somos indispensáveis nos cuidados de saúde. Saiba que são precisos (é a ministra que o diz, não sou eu) mais de 3000 enfermeiros nos cuidados de saúde primários (para prestar cuidados de proximidade, educação para a saúde, promoção da saúde, cuidados ao domicílio - que previnem as doenças, evitam os internamentos e as complicações quando os doentes vão com alta para casa e escusam cuidados altamente tecnológicos e caros de hospitais) e mais de 5000 nos hospitais (LOGO, AO CONTRARIO DO QUE PENSA, NÃO SÃO PRECISOS MENOS ENFERMEIROS); saiba que SALVAMOS VIDAS TODOS OS DIAS, que prestamos cuidados COMPLEXOS E DIFERENCIADOS, que poupamos aos hospitais, aos contribuintes, ao estado muito dinheiro, AOS DOENTES MUITO SOFRIMENTO ESCUSADO por má avaliação da equipa de saúde, erros médicos, pormenores fundamentais descurados.

Unknown disse...

Parte 4 (e desculpe a extensão, mas teve de ser):

Faça uma experiência: mande os enfermeiros embora durante um fim-de-semana e apareça nos locais de trabalho na segundo de manhã. Muitos doentes estarão mortos: afogados no próprio vómito, comida, água; caídos no chão, numa poça de sangue pela cabeça partida. Outros a gritar, dores incontroláveis que o Dr. acha que passam muito bem só com paracetamol, outros magros que nem um caniço porque ninguém os incetivou a comer, todos eles sujos, fedorentos, alagados nas fraldas da própria urina e em feridas e escaras de tão incríveis por em apenas 2 dias se terem formado; poucos tomaram a medicação, e, quem lha deu, não tomou em consideração sinais vitais e outros parâmetros (tendo alguns morrido por complicações associadas) ou então enganou-se a administrar o que quer que fosse. Nos cuidados intensivos, TODOS ELES MORTOS, NÃO ESCAPA NEM UM. Na reabilitação todos deitados na caminha, a fazer pneumonias de estase e a gerar anquiloses; na psiquiatria uns quantos a atacar os outros, a roubar, violar, agredir quem quer que encontrem. Muito apocalíptico? Tire o curso e exerça enfermagem para ver que, em 2 dias, a sua opinião sobre a profissão nunca mais seria a mesma.

Somos precisos, mas não somos respeitados. Por doentes, por colegas seus, por políticos, pela sociedade em geral. Temos um problema grande de excesso de vagas. A goludice de uns sobrepos-se aos interesses de toda a classe. Mas sabe bem e deve ser divulgado, de tão estranho ser, quando um "maluco" de um político vem dizer que, no decurso da doença, o que foi verdadeiramente o impressionou, condicionou e influenciou o decurso da doença e do modo como lidou com ela não foi o médico A ou B, ou a Radio ou a Quimio (aos quais não tiro a importância que, naturalmente, lhes é devida), foram sim os Enfermeiros.

Quanto menos enfermeiros, maior risco há para a saúde, piores cuidados de saúde existem, maiores dificuldades se avizinham. Precisamos sim de mais enfermeiros. Tendo quatro doentes distribuidos para um enfermeiro, cada doente que acrescenta nessa distribuição aumenta em 7% o risco de ocorrer uma complicação grave e potencialmente mortal em qualquer um dos doentes. Quanto maiores os apregoados rácios enfermeiro-doente, maior o risco de morbilidade e mortalidade (os estudos estão online). VEJA LÁ QUE AFINAL AS PRESCRIÇÕES DOS ENFERMEIROS, SEM SEREM FORMALIZADAS PELO MÉDICO, ATÉ SÃO IMPORTANTES...

Um abraço e mantenha o espírito positivo e de partilha. Espero com isto ter contribuído para lhe ampliar ainda mais a visão da profissão!

Placebo disse...

Bem, na maior parte do texto, tenho dificuladdes em perceber se concorda, discorda, ou nem uma coisa nem outra.

Alguns pontos de resposta, já que parece educado:

-Nunca disse que havia excesso de Enfermeiros. Disse que havia enfermeiros a mais, como atestam o desemprego e a chantagem salarial. Se são precisos, e provavelmente são, não os contratam na mesma.

-Quanto à essência e imprescindibilidade da profissão, não use a simulação mais básica.... Por esse prisma, se os senhores das bombas de gasolina fizerem greve por tempo suficiente, morrem os doentes todos por falta de cuidados, e os profissionais de saúde todos à fome mais tarde. Nunca pus em causa a importância da sua profissão, por isso não percebi....

-Eu sei bem a importância dos registos. Porém, achar que os registos melhoram cuidados é perigoso. Conheço quem faça belas ficções registadas, que porém pouco acabam por ter a ver com a realidade que supostamente retratariam (a "defesa legal" eventual passa a assumir particular importância para muitos), e pessoas que por estarem junto de quem precisa resumem as coisas, em registos que (é pacífico) se querem feitos, sumarizados mas com qualidade, de preferência informatizados. Sem nunca descurar o essencial: não afastar o profissional do doente. Foi esse o ponto que quis salientar, e que a meu ver começa a constituir um problema, não apenas na Enfermagem.

-Ficaria admirado de saber até que ponto posso estar próximo dos enfermeiros e do que eles fazem. Não me vou alongar nessa alínea, mas nem todos os médicos são autistas, e tenho amigos (não confundir com "conhecidos do trabalho com quem simpatizo e troco umas palavras agradáveis") que me transmitem muito bem, na perspectiva deles, muitas questões que vos atormentam.

-Já agora, uma das questões que atormenta a sua classe é confundirem, sobretudo as chefias, especialização com competência. Daria um post....

Em resumo, só para acabar, eu devo escrever muito pior do que pensava....

Unknown disse...

Agradeço a resposta, e como é óbvio, é na educação e respeito mútuo que estas discussões merecem ser realizadas.

Concordo consigo na perspectiva que afirma ter face à sua equipa de trabalho, repito, e discordo apenas da opinião que expressou face ao que deve ser um enfermeiro, por me parecer algo redutora. Não teve tempo para escrever mais, não quis maçar o leitor com tantas palavras, ou qual tenha sido a razão, soube a pouco e para quem lê, confere uma ideia muito básica.

Quis apenas, nos posts prévios, dar mais algum sentido àquilo que fazemos, que a maioria da sociedade está alheia e não confere o devido reconhecimento. Óbvio que o exemplo da ausência é sempre exagerado e aplicável a todas as profissões. Aquilo que quis transmitir é que nos ocupamos de cuidados que, muitas das vezes, são invisíveis aos olhos de quem chega e vê um doente controlado, a comer, a andar e a respirar regularmente. Fazem toda a diferença (e nada têm a ver com prescrever ou deixar de prescrever, às vezes a culpa é nossa de não demonstrar a sua importância), mas não são devidamente valorizados. Quis reforçá-los pois, novamente o digo, a descrição que escreveu me pareceu demasiado básica e adequada ao que fazíamos e ao modo como pensávamos há 20 anos atrás.

Dos registos concordo com o risco de serem levados ao extremo, deixando de lado os cuidados ao doente. Esperemos pela informatização, pode ser que corra bem.

No meio disto tudo, em todas as profissões, há bons e menos bons, há quem se desculpe nos registos e não faça o que deve fazer, concordo.

Quanto à especialização, naturalmente que os conhecimentos adquiridos durante um curso e que depois são colocados em prática na altura correcta, reflectem competência (pelo menos é a definição que tenho da palavra). Vamos adquirindo novos saberes e se os soubermos adequar, responsabilizando-nos pelo que pode correr mal e saber como actuar nessas alturas, então teremos adquirido novas competências. Quem as regula e porquê já é outra história. Dizer apenas que se não fosse necessária a evolução que houve na enfermagem, os governos não a teriam permitido.

Felizmente trabalho com alguns médicos cujo profissionalismo, respeito e interacção são formidáveis, parece ser o seu caso.

E se quer que lhe diga, e em jeito de desabafo, só quero duas coisas:

- trabalhar em equipa, em prol do doente, SEMPRE, sem atritos ou pruridos dispensáveis (que também referiu);

- ver maior reconhecimento, respeito e recompensa à minha profissão que, pelo que a vejo como é e deve ser, merece mais sim senhor!

Como vê, até estamos de acordo em muitas coisas, pode ser também o leitor que não tenha apanhado tudo à primeira!

Boas escritas!

Carla Allen disse...

Boa tarde,

Antes de mais devo congratulá-lo pela sua visão esclarecida de como se trabalha facilmente e livremente em equipa. Acabar com a competitividade médico/enfermeiro é emergente, não somos concorrentes pois como explicou e muito bem, temos tempos de formação diferentes e como tal competências diferentes mas complementares. Ao trabalharmos em parceria, ambas as classes ganham e fundamentalmente a qualidade de cuidados prestados ao doente.
Só a título de curiosidade e para salientar outra luta, é o caso das Enfermeiras Especialistas em Saúde Materna e Obstétrica (é o meu caso).
A partir de 1986, com a adesão de Portugal à União Europeia, a formação e a actividade das parteiras passaram a ser reguladas por directivas comunitárias. Deste modo, os profissionais podem exercer a sua actividade em qualquer país da Europa. O artigo 4º da directiva comunitária 80/155 enuncia as actividades para as quais as parteiras se encontram habilitadas, entre elas, está o aconselhamento em matéria de planeamento familiar, a vigilância da gravidez normal, a prescrição de exames, a elaboração de programas de preparação para o parto, a assistência ao parto normal e o exame ao recém-nascido. No entanto, este artigo não consta no decreto-Lei nº333/87, que transpôs para o direito interno português a directiva europeia.
Por isso, apesar de as parteiras terem essas competências, não existe na legislação portuguesa nenhum documento que explicite as suas actividades. Daí, gerar-se alguma confusão sobre o que podemos e não podemos fazer.
Agora diga-me se faz algum sentido o que se passa neste país, não consigo pereber do que a classe médica tem medo, que os enfermeiros lhes "roubem" competências? Do que o médico tem competância e habilitações para fazer, é do conhecimento público e jamais lhe será retirado, os enfermeiros são proissionais de saúde que com a sua formação permite que trabalhem em perfeita harmonia e parceria nos cuidados de saúde à população. Passe a palavra junto dos seu colegas, para que seja possível terem a mente tão esclarecida como a sua e sem medo, porque os enfermeiros não são "bichos papões" do poder médico instituído na sociedade, porque isso é cultural e nunca vai deixar de existir, descansem, só queremos trabalhar com qualidade e com as competências que nos estão destinadas e para as quais estamos devidamente habilitados.

Parabéns mais uma vez.