quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

As Ilhas

Em resposta a um comentador do post anterior: não, nem tudo é mau nos serviços de Urgência, e nos diferentes hospitais por esse país fora.
Devia, obviamente, dar-me o desconto de, sendo eu português, ainda que preocupado em passar ao lado do grosso dos estereotipos da espécie, gostar de criticar o que está mal, mais que elogiar o que está bem.
E há ilhas de "bem", sim senhor...:
A boa equipa de enfermagem que nos acompanha e apoia. mesmo no meio do caos; o colega solidário que partilha um cansado sorriso ou um compreensivo levantar de sobrolho; o momento de humor proporcionado por um doente bem disposto, ou por uma das muitas situações caricatas que surgem no meio (o clássico: "onde é que lhe começou a doer a barriga"?; "No intermarché"!); o prazer não reconhecido de ter feito um bom trabalho, ainda que sendo apenas, muitas vezes, uma mera peça na engrenagem complexa da abordagem a certos doentes; o reconhecimento de alguns doentes; a tristeza, sim, também a tristeza, mas consolada, de familiares de outros, que fizeram a sua travessia pelo deserto dos horrores com casos complexos de entes queridos rumo ao inesperado, outras vezes inevitável, exitus; a sensação de dever cumprido; o mérito do esforço para contrariar, muitas vezes, a mediania estabelecida; às vezes, apenas o tentar oferecer um médico de primeira em instalações e sistemas estabelecidos terceiro mundistas....
Mas eu sou internista, como os 2 leitores assíduos deste blog já sabem (a minha mãe e o amigo que aqui colabora, uma vez por ano, assiduamente). Ou seja, sou suspeito, pois por natureza alimento-me com o meu próprio ego.

sábado, 6 de dezembro de 2008

Urgências

Como resolver o problema das Urgências? Não, isto não é uma tentativa para resolver um problema e sacar o Nobel da Gestão 2009, mas apenas para indicar a problemática, bem como a solução impossível. As Urgências são um suplício para quem trabalha, um tédio (valha-nos isso) para quem até saberia trabalhar e prefere encostar-se, e um stress para quem não sabe sequer o que anda naquelas bandas a fazer. O primeiro passo passaria por ver isso: o que anda cada um a fazer, onde são precisos mais meios humanos, ou apenas "melhores" meios humanos. As Urgências são o ponto de confluência de vários tipos de pessoas: aquelas susceptíveis de terem patologia requerendo cuidados urgentes E DIFERENCIADOS de saúde (já que uma amigdalite, não se enquadrando nesse grupo, obviamente que também precisa de atendimento e resolução rápida), ou seja, as "verdadeiras urgências"; outras enviadas por médicos assistentes que, por não terem meios ou não estarem para se chatear, chutam o doente a montante (ou seja, doentes que seguiram o percurso correcto, e que apenas se encontram ali por défice estrutural ou na capacidade de quem lhes deveria ter resolvido logo o problema); e, finalmente, aqueles que vão à Urgência porque "acham que sim", fazendo tábua raza do percurso natural que deveria fazer na doença, passando sempre pelo seu médico assistente (ou SAP, na falta dele), e que deveria fazê-lo não por "birra" de quem está nas Urgências, mas por uma questão de Cidadania, não se imiscuindo entre doentes referenciados àquele nível de cuidados por dele necessitarem realmente, sem dele estar carenciado à partida. Há muitos anos que penso na estratégia certa para uma solução, e vejam lá esta ideia: selecção de diagnósticos (e/ou queixas) para os quais não se deve ir NÃO REFERENCIADO à Urgência (por exemplo: dor de garganta; febre; comichão; etc...), sob pena de, no final, e depois do médico ter diagnosticado o caso, pagar muito caro -em euros- (podia ser após um 1º aviso por escrito de recurso incorrecto desse tipo). No caso dos doentes REFERENCIADOS, averiguar porque é que o são nas situações indevidas, e inquirir o referenciador sobre as suas razões (e resolver o problema, quer seja estrutural, quer seja de capacidade do próprio, penalizando-o). Dir-me-ão que o povinho não sabe à partida se a sua doença é urgente ou não; por isso devem ir ao seu médico assistente, ou ao que estiver de serviço nos cuidados primários, para o saber (se é potencialmente grave a requerer nível superior de cuidados, pois ele é que o saberá dizer, com a propriedade possível). Dir-me-ão outros que os médicos dos cuidados de saúde primários também não estão para se "arriscar", não mandando situações potencialmente graves aos bancos de Urgência; pois ninguém pede para arriscarem: para isso existem guidelines racionais para os ajudar nas situações mais duvidosas; e obviamente que devem mandar sempre os doentes caso o diagnóstico diferencial possível não seja suficiente para tranquilizar o médico (por exemplo, uma dor torácica suspeita, sem Rx de tórax, ECG e enzimas cardíacas, deve ser referenciada sempre); mas nunca, como se vê tanto, porque quer "curto-circuitar" o sistema, ou porque não quer ser contundente com as suas convicções perante o doente ou os seus familiares, ou porque simplesmente não sabe, não observa nem está para se chatear. Outra dica seria pôr médicos a fazer trabalho de médicos, secretários a fazer trabalho de secretários, enfermeiros a fazer trabalho de enfermeiros e auxiliares ou técnicos a fazer trabalho de auxiliares ou técnicos. Isso seria talvez excessivamente revolucionário para estas bandas, neste século, mas eu excedo-me com frequência quando começo a escrever... onde já se viu tal coisa? Já sei, nas séries americanas sobre Urgências, que como todos sabem, não passam de ficção científica. Mas e se o médico, em vez de fazer ECG's, deixasse esse trabalho aos técnicos de ECG's? E se não tivesse que despir os doentes, sempre que necessário, antes de os observar, deixando o trabalho para um auxiliar? E se não tivesse que medir os parâmetros vitais, deixando o trabalho a um qualquer enfermeiro? E se não tivesse, durante estes processos, que encontrar os aparelhos esparsos pelo recinto, ligá-los à tomada mais próxima, substituir os componentes que se vão gastando, numa passeata que consome um tempo infinito, raramente relaxante quando se está a adiar o essencial da razão da vinda da criatura contribuinte à instituição? Deitar doentes, levantar doentes, passar um urinol aos doentes, descascar doentes, chamar e procurar por alguém que dê continuidade ao que se vai pedindo? Ou seja, e se o médico "apenas" colhesse histórias, observasse doentes, executasse algumas técnicas diferenciadas que pudessem ser necessárias no caso-a-caso, e prescrevesse os tratamentos respectivos? Podendo assim ver o dobro dos doentes com metade do desgaste, o dobro do sucesso e metade do custo para a instituição (já que um médico continua a ser relativamente "caro", quando contratado para fazer o trabalho de qualquer um dos outros...)? Ou seja, e se as instituições de saúde tivessem os profissionais certos, para executar as tarefas necessárias? Bem, desculpem-me então esse delírio final, e os outros todos antes desse, mas concedam-me lá o direito de também acreditar um pouco, nesta quadra, no Pai Natal....

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Doutor, Posso Comer Gorduras?

A não ser que esteja muito, muito doente....