terça-feira, 29 de setembro de 2009

Notícias Pedagógicas

A propósito desta notícia (http://medicoexplicamedicinaaintelectuais.blogspot.com/2009/09/aprender-com-imprensa-regional-e-local.html) que MEMI divulga, tenho a comentar o seguinte:
1) O doente, até prova em contrário (e a prova existente é boa: autópsia médico-legal), morreu com enfarte agudo do miocárdio (EAM);
2) O doente, para ter um enfarte, não precisa de responder a nenhuns critérios, ao contrário do defendido pela arguida. Só precisa mesmo é de ter um enfarte; os critérios são o que torna, com base científica de evidence based Medicine, lícito ou não considerar-se o diagnóstico, num número aceitável de casos; é pedagógico dizer-se que, mesmo com base numa "boa prática", se deixam sempre escapar alguns diagnósticos, com consequências de gravidade variável;
3) Acho curiosas várias afirmações da arguida
-Em primeiro lugar, não assumir que o papel dela, ao contrário do pressuposto, não é o de dizer que a patologia (EAM) não é presumível, mas sim excluí-la;
-Em segundo lugar, o de dizer que dores abdominais e vómitos não fazem parte do quadro clínico;
-Em terceiro lugar, o de desvalorizar a excelente sensibilidade e a quase perfeita especificidade da troponina (é esse o marcador laboratorial do qual estão a falar), faltando obviamente saber-se de que valores absolutos da proteína estamos a falar; para quem entende destas matérias, a insuficiência renal só pode levar a uma sobre-estimativa da troponinemia (e da massa cardíaca necrosada), continuando a haver, sempre que ela estiver aumentada, necrose do miocárdio;
-A arguida ainda divide as responsabilidades da alta com um Internista, que defendia que a doente teria um EAM, e não uma pneumonia como ela suspeitava; ora, a pneumonia cursa com consolidação ou "hepatização" do pulmão, facilmente identificável em qualquer autópsia (trata-se de uma alteração muito mais grosseira que, por exemplo, a de um EAM); além do pormenor: a doente teve mesmo um EAM;
-É óbvio que nem o Internista tem autoridade para internar doentes em Cardiologia, nem a Cardiologista tem autoridade para internar doentes em Medicina Interna; o que sucede é que a cardiologista achou que o doente não tinha EAM, e o internista achou que, excluído EAM por quem de direito (e demais patologias por ele próprio), o doente não tinha outros motivos para permanecer no Hospital; acontece que, note-se, tinha mesmo um EAM...;
-A maior parte dos EAM, ou pelo menos boa parte do que chegam ao Hospital a respirar, não estão "instáveis do ponto de vista cardiológico", seja lá o que isso quererá dizer; presumo que signifique que não estava, nem em choque cardiogénico, nem em edema agudo do pulmão, tal como a maioria dos EAM nestas condições, mas enfim...;
-Apesar de toda esta evidência, a arguida continua a insistir que a causa de morte foi, não a que está identificada, mas sim outra, que concerteza terá passado despercebida ao Médico Legista que fez a autópsia, e que por acaso compromete outro colega seu.
Ou seja, caros leitores, o perfeito exemplo de como uma médica não se deveria comportar em tribunal (a acreditar no relato como sendo verosímil, claro está), uma vez que:
-O doente teve um EAM, e morreu por causa do EAM, até prova em contrário (e a prova está na autópsia, a única coisa "contestável" nesta fase);
-O facto de não se ter diagnosticado EAM não é sinónimo de negligência, mas é obviamente um erro, e não há que ter vergonha nenhuma em assumi-lo, desde que se tenha a consciência tranquila, e se tenham feito os procedimentos conformes à legis artis; os familiares querem explicações sobre o sucedido, tratando-se de uma preocupação natural, e legítima neste caso, face ao inesperado trajecto do doente, e ao seu trágico desfecho; ou seja, por aí, nada de anormal, e a colega arguida deste processo ficaria entregue à investigação técnica que certamente decorreu entretanto (aos processos, aos intervenientes, ...), e à decisão do tribunal face ao "erro"; em Medicina, tomam-se decisões, e algumas não são as acertadas, faz parte dos riscos do ofício, e não há nada nem ninguém que consiga remediar isso a 100%; ou seja, todos erramos, podemos é ter sorte nas consequências (nem todos os nossos erros resultam, felizmente, na morte dos doentes);
-O que não é bonito, e de mau prenúncio quanto à tal correcção de procedimentos que terá havido (ou não), é toda essa desinformação cientificamente errada que a colega parece fazer questão de transmitir, e essa tentativa de deixar transparecer perante os julgadores que a culpa da morte do doente é de outro médico, que não ela;
-Portanto, deve ter sido o Internista que não diagnosticou uma pneumonia, que o Médico Legista não observou, mas que ela, enquanto cardiologista, desconfia que o doente tinha; isto apesar do Internista e do Médico Legista terem, respectivamente, achado e confirmado que o doente apresentava um EAM.
É feio, muito feio....

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Constatações e/ou Reflexões (Básicas II)

Pode ser mais ou menos acompanhada;
Pode estar mais ou menos rodeada;
Pode ser rápida ou prolongada (está a rimar, mas não é poesia);
Pode ser precoce ou tardia;
Pode ser espiritual ou pragmática;
Pode ser dolorosa ou bem analgesiada.
Mas há uma coisa, na morte não súbita, que é comum a todas as que já assisti na minha vida (e foram algumas...):
-Uma imensa solidão, a agonia da impotência, por essa sempre inesperada traição do corpo.
Pensava que bastava morfina, mas também vou querer propofol.
Tinha dúvidas dantes, mas hoje sei que vou precisar de ajuda.
Penso que a eutanásia acaba por fazer sentido para todos, a dada altura do fim da sua vida. Nem que seja nos últimos minutos.

Reflexões Básicas

Factos e suposições.
Factos:
-Numa casa qualquer de família, não raras vezes, nomeadamente quando o caos, a discórdia e a confusão se instalam entre a criançada, é necessário um reset dos comportamentos mais "desviantes" através da imposição da ordem por parte de uma figura autoritária (neste caso, geralmente, o pai ou a mãe); do género: "ficas de castigo no teu quarto, e nem mais uma palavra!". Vocês sabem....
-Por outro lado, e este exemplo diz respeito a outra vertente da minha vida, no trabalho, chefes "moles" ou demasiado "simpáticos" permitem (sistematicamente) abusos em termos (de falta) de esforço e dedicação na execução das actividades diárias, de pontualidade, e globalmente de qualidade no trabalho; por outro lado, chefes mais autoritários/severos obrigam quase sempre a maior empenho na melhoria de todas estas facetas.
Suposição:
-Se nas nossas casas e no nosso trabalho (unanimemente, ainda que nem sempre reconhecidamente) é salutar e até necessário um certo componente de autoritarismo, porque é que achamos quase todos que um país não carece dele?

domingo, 27 de setembro de 2009

Eleições - Parte II (Legislativas)

Não vou votar.
Pensei no voto PSD (saudosismo de um ideal de governos-Cavaco), no voto CDS (ideologicamente, quando havia ideologia), no voto CDU (o voto inofensivo de protesto, nos dias que correm, em gente com valores, ainda que maioritariamente absurdos e desfasados da realidade), até, imagine-se, no voto PS (o inédito desse sentimento é, no meu caso, puro mérito do governo do Engº/Bacharel/Encartado de forma irrelevantemente ilegítima com uma licenciatura).
Não votarei no PSD porque não difere deste governo (apenas tem uma líder menos patética), com a agravante de não assegurar um governo com a qualidade do que sai agora (com todos os seus defeitos, eu sei, mas também já lá estiveram antes e nunca foram perfeitos...).
Não votarei no CDS porque já não existe.
Não votarei CDU porque julgo que os tempos que correm não estão para brincadeiras de mau gosto.
E não votarei no PS, apenas e só, porque me repugna demais a figura do seu líder (e alguns dos seus acólitos aparelhistas de profissão cujos nomes, higienicamente, nunca me dispus sequer a memorizar), os seus tiques, não de autoritarismo (que por si só não é um defeito) mas de "birrice" (daquela que curto-circuita seriamente a paciência), e todo o manancial mediático que o rodeia e "traveste" de gente segura, firme e capaz. Confesso que se rodeou de gente melhor que ele neste governo. Bem, em nome da justiça das palavras, devo dizer que se rodeou mesmo de alguma gente boa, e não apenas melhor que ele. É por isso fraco motivo esse, para não lhe dar o meu sentido de voto, bem sei, mas eu também não tenho pretenções a ser um Grande Homem....
Fartei-me de pensar, aliás ainda estou a pensar, e acabei por me dar vencido pela maior (boa) lição da Democracia: a minha irrelevância, enquanto unidade de um valor absoluto de meia-dúzia de milhões. Sou assim a modos que a mortalidade da gripe A: irrelevante, desprezível, que não carece de qualquer acção correctiva ou orientadora. Falando em saúde, há que ser rigoroso e dizer que, democraticamente, sou ainda mais irrelevante que aquela (mas a ideia que venho tentando passar oblige a certas metáforas, como compreenderão).
E isso não é falta de civismo, desinteresse na coisa pública ou irresponsabilidade.
É Matemática!
Por fim, a idade ensina-me que não conseguimos perceber muito acerca das áreas que não são as da nossa diferenciação profissional (ou passional, o que para mim está longe de ser o caso). Pelo menos, não conseguimos perceber o suficiente, e já não é mau quando dominamos razoavelmente a nossa.
E, francamente, não consigo perceber quem conseguiria formar o governo que precisamos para evitar a insolvência nacional que se diz estar para chegar, mais ano menos ano. Nem sei se seria possível perceber-se, se algum dos meus concidadãos consegue perceber, se alguém quis explicar, ou sequer se é perceptível e/ou explicável. Se conseguisse, juro que votava.
Espero é que ainda haja vergonha na cara, ou pelo menos medo, e que não se brinque aos governos e ministérios pondo em causa o futuro de milhões, a troco de um emprego ou de miseráveis interesses pessoais, sabendo-se de antemão que se percebe tanto desta poda quanto eu. Receio é que seja uma esperança ténue.
A ideia do post, ainda assim, é parecer despretencioso....

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Anda Tudo Grosso....

"Primeira morte confirmada pelo vírus H1N1 em Portugal!"
Onde é que já viram isto, meus caros leitores?
Nem tenho palavras, e peço desculpas, mas o ridículo da questão afecta a minha capacidade de sarcasmo.
O Homem de 40 e tal anos é transplantado renal há 14.
O que significa uma doença de base grave que o levou à insuficiência renal terminal, com necessidade de suporte dialítico, ou, como se veio a verificar (e talvez posteriormente), de um transplante.
Essa doença de base grave pode ter comprometido pontualmente o rim ou, hipótese de longe mais provável, ser uma doença sistémica que também compromete, só por si, vários outros órgãos, com eventual falência relativa de alguns deles, e de agravamento potencialmente progressivo. Pode ser uma doença sistémica auto-imune, diabetes, uma panóplia delas. A evoluir até à insuficiência renal há mais de 14 anos atrás, e depois disso até aos dias de hoje.
Por ser transplantado está imunossuprimido há 14 anos, com vários medicamentos que lhe comprometem desde sempre a imunidade contra toda e qualquer infecção (bacteriana, viral, ...), aumentando-lhe a susceptibilidade, quer de se infectar, quer da gravidade da infecção ser substancialmente maior.
Ainda por cima, apesar da imunossupressão, verifica-se rejeição do transplante, com todas as complicações que daí advêm.
A imunossupressão por si só, e com esta duração já significativa, leva a complicações próprias e graves (efeitos adversos).
O doente desloca-se do centro onde o conhecem para o país Natal, onde a sua situação clínica não está tão dominada como no local de diagnóstico e seguimento de sempre. Por outro lado, esta "viagem" do doente não teria sido a pedido do próprio, já perante um prognóstico reservado? Por que outro motivo ele se deslocaria em situação tão instável? Ninguém sabe ainda, e quando se souber, ninguém vai ligar.
Por último, o doente vem para Portugal com o diagnóstico confirmado de pneumonia bacteriana, ao qual se acrescenta o de uma infecção com ponto de partida abdominal (renal?), o que, já agora, são patologias graves que ameaçam seriamente o prognóstico vital em qualquer pessoa de outro modo sã (quanto mais imunossuprimida, com doença sistémica grave de base, com complicações da imunossupressão, em rejeição, ...).
Finalmente, um belo dia, alguém lhe pede um teste para um vírus, porque os vizinhos do lado estariam infectados e porque está na moda (o que diz muito do grau de investimento que estava a ser oferecido ao paciente, relembro que imunossuprimido e gravemente infectado). O teste vem positivo. O doente sucumbe.
Mas alguém no seu perfeito juízo duvida, por um segundo que seja, que este homem morreu por causa do vírus H1N1?
Eu, se mandasse nisto, cancelava já as férias a médicos e militares, e declarava a lei marcial.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Ei-Lo, Aqui Tão Lindo

H1N1 (fonte: Instituto Pasteur)

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Fibromialgias

-Então o que é isso de fibromialgia?
-É uma doença em que há diminuição do limiar da dor. Acontece sobretudo em Sras, mas há casos em homens, como o seu.
-Então e porque é que as dores não passam?
-São de difícil controlo, nessa doença.
-Porque é que tudo me faz mal?
-Nem tudo lhe faz mal.... Mas havemos de encontrar a "receita" que o melhora.
-Mas os remédios que me tem dado pouco ou nada de bom me têm feito....
-Às vezes leva tempo.
-Então agora continuo com a duloxetina e a gabapentina?
-Sim. Só vamos subir a dose da gabapentina.
-E essa azia que tenho?
-Ah.... Também tem azia?
-Sim. E essas dores de barriga, às vezes.
-Pronto, mas já fizemos TC ao adbómen e colonoscopia, por isso não temos que repetir esses exames, está tudo bem aí. Vamos então pedir uma endoscopia digestiva alta, que ainda não fez, para excluir doença péptica, ver se tem Helicobacter pylorii....
-Esse exame custa?
-É como engolir um esparguete!
-A sério?
-Não, estou a brincar. É igual à colonoscopia que já fez, só que para ver o estômago, através da boca. Costumam dizer-me que custa bastante menos.
-Menos?
-Sim.
-Mas a mim não me custou nada, até gostei!
-(...) Bem... se não lhe custou nada, digo-lhe já que isso não é nada frequente, mas ainda bem porque...
-Não é que não me custou! Eu até gostei, fiquei muito aliviado!
-(...!)
-Ah, e já agora, tenho uns problemas com a minha namorada, penso que é desses remédios que me está a dar!
-Que problemas?
-Não consigo ficar com "tesão"!
-Porque acha que é dos remédios?
-Dantes tinha!
-E nunca consegue, ou só às vezes?
-Nunca!
-E não quer experimentar alguma coisa, a vez se melhora dessa disfunção?
-Não, deixe estar. Não se pode parar algum destes medicamentos?
-Pode-se, mas a custo de comprometermos o tratamento da dor.
-Depois vê-se. Quando é a próxima consulta?

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Voltando ao Holocausto

Casos de gripe CONFIRMADA na Europa, no dia 17/Setembro: 52.057
Casos de morte: 144
Mortalidade (estimativa maximizada): 0,28%
(fonte: European Center of Disease Control)

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Não Tem Nada a Ver com Isto, mas...

Um desabafo.
Quem, como eu, segue aquela linha tradicionalista e cómoda de modelo familiar, casando, e tendo filhos, só pode concluir uma coisa: algo correu muito mal no trajecto da evolução das sociedades (da nossa, neste caso).
De uma forma mais ou menos monótona, lá fui estudando muito, tendo boas notas, lá entrei numa faculdade e licenciei-me num curso cuja profissão até tem saída e dá para viver, olhando para a média da restante populaça, razoavelmente bem (em termos de remuneração mensal).
Então começa a estupefacção. Tem-se um filho, e depois, quem toma conta dele?
Se for médico e tiver, além do horário que lhe ocupa o dia regular, mais o acampamento de 24 horas semanal com os amigos num qualquer Serviço de Urgência, e se a sua esposa tiver o mesmo programa de entretenimento, a porca começa a torcer o rabo.
Nos primeiros 4 meses vá lá, alguém está em casa. Depois, começa o cada um por si. Toca a procurar uma ama, ou uma creche, com "horário flexível", em alternativa ao argumento que ninguém parece compreender, e que consiste num suicidário: "lamento informar os restantes "utentes" que estão há horas à espera por uma consulta, mas os meus filhos estão à minha espera com a educadora à porta da creche, e tenho que os ir buscar". Ou informar o chefe de equipa de Urgência que, pasme-se, as educadoras não me ficam com os filhos de noite, e que nesse dia não posso ir além de um terço da minha estadia prevista por lá. Ou pedir ao doente que está a descompensar na enfermaria que faça uma pausa e retome no dia seguinte de onde estamos, por estar com pressa por motivos familiares. Nem declarar game over, e talvez amanhã me despache um bocadinho mais neste, afinal, contínuo processo de formação profissional.
Depois chegam as "férias". Mas férias para quem? As dos meus filhos decorrem num corropio de actividades entrecortadas por rallis citadinos a caminho de outras. Os pais, nem se fala e ninguém quer saber. E há férias de Natal, Páscoa, Grandes, até uns dias no Carnaval e umas pontezitas. Curiosamente, o meu regime de férias, por mais imaginação e desfasamento com a co-progenitora da descendência, não consegue açambarcar o manancial de dias que seriam necessários para alguém lhes dar de comer ao almoço, nesses dias.
Em resumo, os meus filhos são uns desgraçados. Algures entre a avó e a mãe, decidiu-se que todos deviam trabalhar, e eles foram esquecidos pelo meio. Ainda acusam vozes superiores na abstração: "os pais querem que sejam as instituições a cuidar dos seus filhos".
Eu cá, pai declarado inconsciente, contento-me com uma de duas coisas:
1) Não eduquem, mas dêem-me lá uma alternativa a "ninguém" para tratar dos meus filhos naqueles horários que, pelos vistos (e contra as minhas expectativas quando enveredei incialmente pela profissão), tenho mesmo que cumprir;
2) Aceitem os miudos de volta, já que apesar do produto até ser francamente bom, a manutenção com um mínimo de qualidade é-me manifestamente impossível. E assim, o produto acabar-se-á por estragar.
Nunca mais me esqueço do fácies psiquiátrico do administrativo a quem propus a criação de uma espécie de creche nas próprias instalações do Hospital. Até havia uma psicóloga interessada nessa (manifesta) óptima janela de oportunidade de negócio, e as instalações físicas eram mais que muitos. Enfim, digamos que se fosse na Era das EPE's, já eu lá não cantava.... Eram tempos de ingenuidade, esses.
"Adapta-te, pá", estarão a pensar os menos empáticos. Desiludam-se, meus: eu estou totalmente adaptado! As 48 semanais que passo separado da minha cônjuge, por necessidade de desfasamento das nossas Urgências, servem para reforçar o componente de "saudades" que desta forma alimentamos em permanência. A falta de paciência nas saídas de Urgência (de um e de outro) servem para incrementar o "factor disciplina", com imperiais apelos ao silêncio sob pena de defenestrarmos algum, para servir de exemplo, neste caso ao outro. O sono e o cansaço estimulam ao cumprimento do saudável lema de "deitar cedo...". O "cedo erguer" é que se dispensava nos fins-de-semana em que não se está de serviço, mas este não é um mundo perfeito. O auto-didactismo das crianças é estimulado até à exaustão, por falta de paciência. O nosso dinheiro circula, numa redistribuição constante, para as creches e colégios com capacidade para conter os miudos até mais tarde, e recebê-los mais cedo, do que este maravilhoso Serviço Público de Educação que só me leva a concluir que eu, pelo menos, não sou seguramente "público" (o que alimenta a minha convicção de ser, efectivamente, um priviligiado "à margem"). E para as horas extraordinárias da empregada, para as baby-sitter, para os "tempos livres", e para os longos trajectos (combustível + portagens) até às casas de familiares nas alturas de maior desespero.
Eu, com os meus meios e limitações, tal como todas as famílias enganadas por esse Portugal fora, adaptamo-nos.
Não nos venham é com moralismos de merda acerca do que devia ser educar uma criança se faz favor, cambada de frígidos/maricas travestidos de psicólogos, educólogos, pedagogos, políticos e/ou idiotas em geral.
Assim vai o mundo.
As crianças, essas, adaptam-se a tudo, e aceitam esta anormalidade com desportivismo. Nunca conheceram outra realidade, felizmente.
Valha-nos isso....

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Diálogos IX (O Que Conta É a Intenção)

-VMER, aqui CODU, possível paragem cárdio-respiratória no sítio x
-CODU, aqui VMER, vamos a caminho!
(...)
-Dr, por aqui, a minha mãe está mal e o meu filho está a tentar ajudá-la!
-Então, o que é que se passou?
-Ela escorregou, e ficou como morta, estendida no chão!
(Jovem a exercer vigorosa massagem cardíaca numa velhinha)
-(a velhinha) "ai, ai, ai"! (ao compasso das compressões torácicas)
-Deixe estar, amigo, a gente prossegue a partir daqui....
-(o jovem) Ela já está melhor?
-Bem, em paragem já (?) não está! (sorrisos do Enfermeiro)
(2 horas depois, no Serviço de Urgências)
-(o neto, com a adrenalina ainda nos píncaros) Então, o que teve a minha avó?
-Tanto quanto ela nos conseguiu contar, escorregou, bateu com a cabeça e ficou um pouco estonteada, mas não tem nada de muito grave, não tem problemas cardíacos, e fez um TAC crânio-encefálico que não mostrou nada.
-Quer dizer que ela vai ter alta?
-Não, fica internada em Cirurgia por múltiplas fracturas de costelas com Volet costal.

sábado, 12 de setembro de 2009

Diálogos VIII

-Sr x, vai ter que ficar internado em SO, para ver se melhora um pouco antes de seguir para a enfermaria. -Está bem Dr, avise só a minha família, que está lá fora à minha espera, e não tem notícias minhas há que tempos, desde que cheguei aqui.... -A Sra Enfermeira já vai tratar disso tudo, entregar-lhes o espólio, etc. Até já!
(1 hora depois)
-(ainda no corredor da Urgência) Dr, Dr! Então, nunca mais me levam daqui? Sinto-me cada vez pior! -(...) Dê-me só um segundo (no intervalo entre dois doentes).... Sra Enfermeira, então a transferência do Sr x para o SO? -Ainda não tive tempo, isto está complicado e tenho outras coisas mais urgentes para fazer....
(Outra hora depois)
-Dr, paragem nos Directos! -(...) Mas... é o Sr x! Ele ainda estava no corredor? -Sim, e muito queixoso!
(meia hora de reanimação depois)
-Já avisou os familiares? -Do quê? Não, acho que não... Não me lembro.... -É melhor falar com eles. -"familiares do Sr x ao corredor da Urgência" -Então, Dr, o que se passa com o meu pai? -Olhe, é o seguinte, ele ficou internado em SO, e quando se estava à espera de proceder à transferência, fez paragem cárdio-respiratória, e agora terá que ir para a Unidade de Cuidados Intensivos. -Não me diga? Então, e o que é que ele tem? -Ainda não sei, talvez um enfarte, uma embolia, mas agora.... -Dr, o doente parou outra vez!
(30 minutos depois)
-Olhe, lamento informá-la que o seu pai faleceu.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Estes Intrépidos Espanhóis...

Los médicos censuran la "alarma exagerada" creada ante la nueva gripe

"El 95% de los casos serán leves y se resolverán como cualquier otra gripe", sostiene la Organización Médica Colegial

"Se está creando una alarma y angustia exagerada en torno a la gripe A". Así de claro y tajante es el enunciado de la nota que este martes ha enviado la Organización Médica Colegial (OMC), que ha querido así contribuir a calmar a la población. La OMC admite que los cálculos de que un tercio de la población mundial resultará infectada por el H1N1 son verosímiles, pero enseguida matiza que "el 95% de los casos serán leves y se resolverán en entre tres días y una semana como cualquier otra gripe".

En un esfuerzo por aclarar la situación que se espera este invierno, el organismo que agrupa a todos los colegios médicos recuerda que "la denominada gripe A es más contagiosa que la gripe estacional [la de todos los inviernos], pero es más benigna y su mortalidad es menor". Por eso, ante una sospecha de que se padezca "deberán seguirse idénticas medidas de prevención y tratamiento habituales que con la gripe de todos los años". "En la mayor parte de los casos los síntomas serán leves y remitirán de forma natural sin necesidad de medicinas e incluso de asistencia médica", informan.

La nota no es un ejercicio de voluntarismo. La organización médica se basa en la experiencia de lo que ha pasado en el hemisferio Sur, donde está acabando el invierno. Hasta la fecha, en esa mitad del mundo ha habido "1.796 fallecidos por esta causa, cuando cualquier gripe estacional de las que pasamos todos los años deja sólo en nuestro país entre 1.500 y 3.000 muertos", afirman. También recuerdan el caso de Estados Unidos, donde ha habido un millón de infectados y menos de 600 muertos.

Los niños no deben vacunarse

Por eso, los médicos insisten en que "está claro que la percepción social que se está teniendo de esta gripe no se corresponde con su nivel real de impacto". Y la organización colegial no ha sido la única. También varias asociaciones de pediatras han indicado a Europa Press su "conformidad" con que no se vacune de manera prioritaria a los niños, ya que esta gripe "les afecta incluso menos que el virus de la gripe estacional".

Los niños son "un grupo con mucha morbilidad pero con una sintomatología leve", dice el presidente de la Sociedad Española de Pediatría Extrahospitalaria y Atención Primaria (SEPEAP), José Luis Canela. Las asociaciones médicas temen que con la alerta creada, las personas no se conformen con pasar la gripe en casa, como hace la inmensa mayoría cada año, sino que acudan a los servicios de urgencias al primer síntoma, y los colapsen.

La OMC también explica que "cualquier mujer embarazada es más vulnerable ante cualquier problema de salud incluida la gripe de cada año", por lo que creen que el miedo que puedan sentir por la nueva gripe "ha hecho saltar unas alarmas injustificadas".

Uma classe médica que não se demite das suas funções de informação cientificamente válida à Sociedade onde se insere. "Contra tudo e contra todos", passe o termo.

Parabéns para eles.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Porcalhices que vêm por bem

A paranoia veio mesmo para ficar, pelo menos até se vacinar uma percentagem significativa da população indígena.
Não querendo parecer cínico, só então se falará em "controlo" da pandemia (que dessa forma, graças a Deus, nunca terá chegado a demonstrar o carácter extremamente letal que se vaticinava nos corredores de alguns ministérios).
Não querendo ainda partilhar a fama de alguns esquizofrénicos "profetas", recorrentes nestas alturas, devo dizer que nisto do marketing, as companhias farmacêuticas não estão mesmo para brincadeiras....
Mas enfim, nem tudo são más notícias.
Aliás, devo dizer, explicando melhor, que são sobretudo tudo boas notícias, paradoxalmente.
Estou pois a antever, nos futuros meses, um "efeito euro 2004 melhorado", e passo a explicar. Dentro do despesismo dos estádios, ficou-nos do euro uma rede de cuidados pré-hospitalares sem precedentes por estas bandas (vulgo "INEM"), que seriam exigência da organização supra-nacional.
O euro lá se acabou (tenha-se ou não gostado dos referidos ritos), mas o pré-hospitalar ficou, dando novo fôlego aos cuidados de saúde, tão depauperados neste capítulo que se encontravam, e que não tinham nenhuma perpectiva de melhorar tão fulgurantemente, não fosse o melhor argumento da organização do evento.
Diria que foram-se os dedos, mas ficaram os aneis....
Agora, diria que o "efeito euro 2004" será "melhorado", porque a referida gripe histrionizante não acarretará, parece-me, despesa acrescida aos cofres públicos, para além daquela que se estão a fazer nas "medidas de contingência" para as "eventualidades" que, pasme-se, nos assolam todos os anos, para surpresa dos nativos. Mas deixemo-nos disso, já percebi que ninguém está interessado em saber que se morre que se farta de "gripe" nesta altura desde sempre.
Voltando ao tema, o que vai ficar mesmo, no SNS de todos nós, são moderníssimos aparelhos para detecção por PCR (polimerase chain reaction) de várias estirpes de agentes infecciosos muito interessantes (que não este, a não ser nesta fase inicial em que é preciso mostrar rentabilidade, e que serve de delicioso pretexto); vamos equipar as nossas Unidades de Cuidados Intensivos (e improvisar Cuidados Intermédios) com óptimos ventiladores de última geração, seringas infusoras para substituir as obsoletas, aparelhagem de ventilação não-invasiva, infra-estruturas para (finalmente...) acolher os doentes com gripe (as sazonais também, que vão continuar a acontecer), e até SAG's à discrição, que espero tenham vindo para ficar, também com regularidade sazonal. Cabe-nos a nós não deixar extinguir, no futuro, estas úteis infra-estruturas, mas pelo menos o material será seguramente para ficar.
Enfim, com um pouco de sorte, e se nenhum epidemiologista cretino se lembrar, a troco de 2 minutos de fama num qualquer canal de televisão, de me dar cabo das férias que ainda não gozei, até pode bem ser um dos melhores invernos dos últimos anos.
E para isso basta deixar os politiqueiros que estão à frente das várias ARS's por esse país fora, sedentos de cumprir as directivas dos seus "superiores" de forma completamente acrítica, com extremo zelo pela despesa que vai servir de argumento numa qualquer campanha perto de nós, abrir bem os cordões à bolsa.
A população, essa que vai mesmo ficando doente todos os anos, com aquelas doenças que a vai realmente apoquentando e matando todos os anos, agradece o esforço, independentemente do argumento que o motiva.
É caso para concluir com um: "Grip' Grip', Hurra!!!".