Alguns já me disseram que as posições sobre a Enfermagem neste blog são incompletas e ambíguas.
Não pode ser de outra forma. O espaço seria insuficiente para uma dissertação mais séria, e o objectivo é apenas demonstrar uma visão diferente, limitada e geralmente temática, sobre uma determinada classe que me é próxima e complementar no dia-a-dia.
Em primeiro lugar, cada qual seguiu a profissão que bem entendia. Que eu saiba, isto já não funciona por castas nos dias de hoje, tivemos os mesmos concursos, e fomos distribuídos de acordo com critérios iguais para todos pelas vagas do Ensino Superior que estavam disponíveis, pela ordem que as regras ditavam, de acordo com as vocações de cada qual e respectivos resultados.
Quem foi para Medicina já sabia que não ia ter salário aos 21 anos como (à data) acontecia com os enfermeiros, não ia trabalhar por turnos, etc....
Por outro lado, sabia-se que, a prazo e depois de muito mais tempo de estudo, se teria melhor salário, bancos de 24 horas (conforme as Especialidades), e nessa fase dos 18 anos pouco mais....
Posto isto, não vou rematar com um "cada qual, a partir daí, deve viver com as competências das respectivas profissões".
Essas competências, já o escrevi, devem ser, e são, dinâmicas.
Concretamente, a questão da "prescrição", e dos "diagnósticos de Enfermagem". Grande parte da celeuma que isso causa na minha "Classe" se deve ao facto de julgarmos que o Enfermeiro se vai sentar em frente ao doente e, do alto dos seus 4 anos de curso, desatar a adivinhar qual a doença do doente, e como a deverá tratar, tal como um médico o faz após 6 anos de curso, 2 de Internato Geral e 4 a 6 de Especialização. Ou seja, que os Enfermeiros pretendem a mesma competência com metade a um terço da nossa formação.
Não é obviamente disso que se trata, e em vez de alguma facção radical-caviar da Enfermagem se dedicar a ressabiamentos foleiros acerca de um mal gerido complexo de inferioridade quanto aos médicos (o que é obrigatório acontecer quando ignoram competências alheias para as quais não estão nem de perto capazes de assegurar com qualidade semelhante), traduzidos muitas vezes em chavões próprios de mentecaptos, como a comparação de competências diferentes, logo incomparáveis, aproveitando-se sobretudo de alguma insatisfação na classe por problemas laborais decorrentes quase exclusivamente do excesso de profissionais (para as vagas existentes).
Em vez disso, dizia eu, deviam-se dedicar em explicar o que isso deve significar concretamente, para a devida definição das coisas e a melhoria subsequente dos cuidados aos doentes, que é no fundo o fim comum a que todos os profissionais sérios se deveriam dedicar, sejam médicos ou enfermeiros.
E é importante essa clarificação. "Diagnósticos de Enfermagem" e "Prescrições em Enfermagem" deveria ser, para simplificar, tudo aquilo que qualquer enfermeiro está cansado de saber, mas que tem que pedir ao médico para formalizar, quer o diagnóstico, quer a atitude a tomar em conformidade com o 1º.
O doente tem febre: o Enfermeiro deve dar o anti-pirético, após questionar o doente sobre possíveis alergias, não é necessário um médico para isso, e é ridículo que ainda assim seja nos dias que correm. Idem-aspas para inúmeros outros exemplos que poderia dar, como as obstipações, a gestão de sondas entéricas, vesicais, a gestão de analgésicos em cuidados paliativos, de perfusões de insulina em cuidados intensivos, com variações de acordo com o local em que cada qual está a trabalhar (uma Unidade de Paliativos difere duma de AVC's, que por sua vez é bem diferente de uma de Cuidados Intensivos Cardiológica ou Polivalente, por exemplo). Transportando para Consultas, as questões dos pensos, do tratamento das úlceras, do pé diabético, etc, etc....
No fundo, porque isto já vai longo, o que já acontece, informalmente, em todos os sítios que prezam por uma certa racionalidade na actuação prática, sem pedantices bacocas e delírios de autoridade sobre o conhecimento, que alguns colegas meus tristemente exibem, por outro lado e em contraponto aos radicais que referi antes....
Formalizar, portanto, o que já acontece informalmente nos sítios que trabalham bem.
Felizmente trabalho num sítio onde os médicos são muito bons, quer em qualidades médicas, quer nas pessoais, e os Enfermeiros são ainda melhores, e também nas duas vertentes. Ou seja: é muito fácil tudo isso que referi acima, dependemos todos uns dos outros, ajudamo-nos todos uns aos outros, fazemos tudo aquilo que sabemos e perguntamos o que não sabemos, acrescendo ainda por cima a isso tudo um desnecessário, ainda que sempre bem vindo, sentimento de profunda amizade e respeito uns pelos outros.
Gostamos de trabalhar juntos, mas também de estar juntos quando não trabalhamos. Bem como os "Auxiliares de Acção Médica", que se juntam assim a nós em todos os contextos e nos mesmos moldes.
Isso sim, é saber viver, e melhor ainda, saber trabalhar, bem e com gosto.
E pode acontecer em qualquer sítio, bastando para tal que não haja atritos entre "Classes" sem classe, mas tão só pessoas cheias de classe, ainda que de classes bem diversificadas....