sábado, 28 de novembro de 2009

Férias

Pasmar é bom.
Por conjunturalidades diversas, estas férias não estão a ser bem de descanso à sombra da bananeira, mas enfim, lá estou longe do Hospital, por um período improvável de quase um mês.
Já vou a meio, e estou a gostar, sem pensar em Medicina, apesar dos entrecortes que me fazem sempre aqueles meus doentes crónicos de estimação, que lá me vão ligando com dúvidas existenciais diversas para o meu telemóvel.
Não estou a viajar, mas até prefiro, não sou adepto de aeroportos e aviões, e sempre estranhei essa curiosa apetência de tantos indígenas em fazer de conta que vão conhecer outros países passando neles um fim-de-semana, ou quinze dias, de correria.
Compreendo o atractivo de uma praia tropical, de um museu específico, de um espectáculo pontual exclusivo lá por fora.
Agora, cidades? Vilas, aldeias, paisagens? Uma boa fotografia e estou contentado, dispenso o som e o cheiro.
Por cá é que me sinto bem, apesar de todos os defeitos que tão bem (e tão excessivamente) nos reconhecemos.
Afinal, as férias são aquela coisa que porventura este país produz de melhor.
Eu também acho isso, um bacalhau do Minho, uma visita ao Gerês (com cavalgada para maçaricos se apetecer), uma posta mirandeza em trás-os-montes, uns enchidos das beiras, com sorte um pouco de neve, as planícies alentejanas, as praias do litoral alentejano e do Al(l?)garve, o descanso da sua própria casa, o falar a nossa língua, o ouvir falar a nossa língua, o nosso saneamento razoável, os nosso serviços de saúde acima da média (;-)... ora eis um cocktail para umas boas férias.
E agora, com a vossa licença, vou continuar as minhas, a fumar um saboroso cigarro, a preparar-me para ver o meu querido Sporting, em frente a um saboroso bife do lombo com molho de mostarda e batatas fritas!

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Carlos Arroz

Fiquei a saber, pelo próprio no seu blog, que é o "Sindicalista" que faz "Desabafos".
Esperemos que continue a desabafar.
Só lhe fica bem.

Funerais

Dificilmente imagino cenário onde me sinta tão deslocado quanto o dos funerais a que tenho assistido, felizmente na qualidade de figurante secundário, que dos outros papeis me tenho livrado até aos dias de hoje.
Não posso deixar nunca de pensar qual é o meu papel no filme.
O homenageado não está contemporâneo para presenciar a reverência.
Os actores secundários, familiares directos e amigos próximos do defunto, estão demasiado imbuidos na sua tristeza pela perda para sequer aturar, imagino eu, chavões cretinos como acaba por ser qualquer frase que se formule, com a melhor e mais inteligente das intenções.
O que é suposto fazer ali? Consolar? E como?
-"Olha, a tua mãe já tinha muita idade, e estava a sofrer, foi melhor assim"?
-"É a vida"?
-"Só acontece aos melhores"?
Pensei muito nisso naqueles longos minutos mais recentes num evento similar, e continuo sem chegar a conclusão alguma.
A minha técnica é distância, cumprimento pontual sóbrio e não demasiado acalorado aos mais chegados, e sobretudo silêncio, muito silêncio. Aliás, nem me passa pela cabeça dizer o que quer que seja, por mais que aquilo que esteja a ouvir de algum enlutado me pareça ser uma pergunta.
Resulta.
Mas não deixo de pensar que pareço Darth Vader num cenário qualquer de A Casa na Pradaria.
Quando for finalmente a minha vez de ser a estrela do episódio, façam-me um favor, e sobretudo um favor a vós próprios, meus entes queridos e amigos devotos (sim, és tu, mãe!): fiquem em casa, e esperem, que a dor passa sozinha.

domingo, 15 de novembro de 2009

E agora, um pouco de Ciência...

Facto1: cinco casos mortais "por" gripe H1N1 (dou essa "de barato", para não frustrar os crentes...);
Conclusão1: a gripe H1N1 não faz baixar, aparentemente, a taxa de mortalidade normal para a época, por motivos de gripe.
Facto2: há casos descritos de síndroma de Guillain-Barré em doentes vacinados para a nova estirpe da gripe;
Conclusão2: a vacina anti-gripal "A", aparentemente, não confere imunidade para o síndroma de Guillain-Barré (incidência de 1/100.000*ano, com ou sem vacinas).
O resto, caros leitores, é próprio de conversa entre Druidas, e já me começa a faltar a marmita para este tema....

sábado, 14 de novembro de 2009

Direitos

Eu gostava agora de lançar o mote para a maior das faltas de liberdades dos nossos tempos, neste país (e noutros ditos "mais desenvolvidos"): o direito a uma morte digna.
Com a honrosa excepção dos EUA, com alguma variante é certo (sobretudo na questão da auto-determinação que costuma estar implícita ao "suicídio"...), não se concebe por cá conferir dignidade a quem ainda pugna pela mesma, antecipando de uma forma assistida a morte.
É um assunto que me preocupa bastante, quer pela consciência da inevitabilidade da coisa (morte), quer pela constatação das condições degradantes em que passamos os últimos minutos, horas, dias ou meses da nossa vida.
Por uma questão de vazio/tolerância legal, cada vez mais almas médicas sensíveis deixaram de tolerar o sofrimento dos últimos minutos de vida, até o das últimas horas. Mas quando se começa a prolongar a retro-acção paliativa, o ímpeto diminui, por óbvio impedimento legal, para não dizer por outras questões que dizem respeito à consciência de cada um (religiões e afins...).
Eu defendo a única medida enveredável possível nesse capítulo: liberalização total.
S.Exa quer morrer? Dirige-se a um gabinete, e diz que se quer suicidar, mas que visto ter dúvidas quanto à altura a que se deve atirar para ter um efeito garantido, visto não querer aparecer aos olhos dos seus familiares e conhecidos em forma de papa, ou simplesmente duvidando da eficácia e da analgesia do método, prefere que seja alguém que sabe o que está a fazer a conduzir o processo.
Isso permitiria que se averiguassem as causas da referida vontade suicidária (coisa que hoje não se faz, uma vez que não há portas onde bater quando se chega a essa fase executora), e aferir da sua consistência, com eventual espaço a soluções alternativas (factor porém não essencial, a meu ver), permitiria também que se pudesse planear toda uma série de burocracias que hoje acabam por ficar quase sempre por resolver (e para a envolvência traumatisada tratar mais tarde), e, pormenor relevante, daria ao sujeito (o sujeito, e a sua vontade, essa coisa cada vez mais exótica nos tempos de hoje...) a sempre aprazível capacidade de poder mudar de cenário sem ser em agonia, em sofrimento ou em vergonha.
Confronto-me por vezes com casos de pessoas que tentaram, de uma forma totalmente sincera, pôr termo às suas vidas. Questiono-me sempre, dado que os encontro obviamente em meio hospitalar, o que raio estarei eu a fazer, tentando devolver e/ou manter em vida alguém que, explicitamente, teve a sua última decisão em sentido contrário.
Pode ter mudado de ideias? Talvez, mas francamente, eu que não sou um herói dos nossos tempos, não penso muito nisso e procedo, uma vez que a Judiciária não me atrai por dentro.
E à noite penso noutra coisa.
Gostava era que, quando fosse a minha vez, não carecesse de tantas variáveis, não tivesse um sistema e uma sociedade tão virado contra mim, tão tolerante em deixar-me apodrecer lentamente até não passar de um vegetal respirante sem qualquer capacidade de decisão, sem qualquer consciência, um sistema tão condescendente em criar infra-estruturas desprovidas de pessoal e/ou meios suficientes para me darem conforto, e que no fundo se destinam apenas e só a esconder o estado degradante a que me obrigaram a chegar dos olhos sensíveis da maioria saudável, higienicamente, já que ninguém quer ter demasiada consciência do que vai acontecer naquele dia mais tarde....
E por isso, vamos em frente com o suicídio assistido, como manifestação suprema da liberdade individual, e de sobrevalorização do sujeito e da sua vontade contra a opinião de terceiros, no que respeita à sua vida (e morte).
Quem não estiver de acordo pode objectar conscientemente a fazer este tipo de assistência. Quando for preciso, nessas circunstâncias que desejo, poderão sempre contar comigo, num sistema público e gratuito perto de vós....
Ah, e o suicídio nunca seria obrigatório. Seria só para quem quer, ou para quem, além de querer, precisa (!) dele.
Caso contrário, já me decidi por uma guilhotina artesanal. É limpinho, fácil de coser para a apresentação no funeral ou na cremação (conforme a vontade dos contemporâneos), as conexões nervosas ficam seguramente seccionadas, e a percepção da dor não pode durar mais que alguns breves segundos.
Já imaginei uma complexa rede de seringas infusoras temporizadas, mas é muito mais complicado, sobretudo sem assistência (mas posso sempre tentar convencer um amigo!).
Terminava assegurando-vos que digo isto tudo, não por facilitismo nem crueldade ou insensibilidade, mas sim porque afinal, lá bem no fundo, até sou boa pessoa. Sei do que falo, e sei o que nos espera a todos um dia.
E por menos que acreditem hoje, um dia darão razão a estas palavras.